Amor incontestável

A cruz deixou claro até que ponto o Criador esteve disposto a chegar para salvar o ser humano

 

 por Michelson Borges

 

O missionário adventista brasileiro Ronaldo de Oliveira caminhava juntamente com um grupo de guerrilheiros por uma ressequida savana africana. De repente, um de seus captores gritou: “Fogo! Um incêndio vem em nossa direção!” O líder pediu que fizessem silêncio, se acalmassem e observassem. Ateou fogo em uma área circular espaçosa o bastante para conter todas as pessoas que ali estavam, apagou a fogueira e disse para ficarem dentro da área queimada. Em poucos minutos o incêndio os alcançou e passou por eles sem lhes causar dano. Isso porque a área em que estavam já havia sido queimada.

No Antigo Testamento existiam as chamadas Cidades de Refúgio, para onde aqueles que houvessem cometido um crime não intencional podiam fugir daqueles que quisessem vingar a vítima (ver Núm. 35:11). Tanto as Cidades de Refúgio quanto o fogo na savana africana ilustram bem a obra de Cristo na cruz do Calvário – a expressão máxima do amor de Deus. Ali, o Criador descarregou o fogo de Sua ira contra o pecado e pôde abrigar todos aqueles que desejam refúgio e perdão.

Para ter uma compreensão clara do significado da morte de Cristo (e, conseqüentemente, do amor divino), é preciso analisar a própria origem do grande conflito entre o bem e o mal. Quando Lúcifer, o anjo de luz, se rebelou contra o Criador e foi expulso para a Terra, resolveu envolver na rebelião o ser humano recém-criado. Deus advertira Adão e Eva em relação às artimanhas do inimigo e disse que ele os tentaria à desobediência. Mas Satanás conseguiu fazer com que Eva duvidasse das palavras de Deus e garantiu que, mesmo que desobedecessem, isso de modo algum lhes traria as conseqüências anunciadas pelo Criador.

Eva cedeu. Adão também. E como eles mesmos sabiam, seu destino agora era a morte. Mas Deus tinha um plano alternativo. Sua palavra, de fato, não poderia voltar atrás, afinal o Senhor não mente. Alguém tinha que morrer pela transgressão. Mas Deus também é todo-misericordioso e ama incondicionalmente. Portanto, para poupar Seus filhos arrependidos de passarem pela morte eterna, Deus decidiu: Ele mesmo, na pessoa do Filho, morreria pelos transgressores. Aliás, a palavra “misericórdia” significa justamente “colocar o coração na miséria do outro”. Nesse caso, Deus colocou Seu coração, Seus sentimentos em nossa miserável condição de pecadores.

Quem é o Filho de Deus

O sacrifício e o amor de Deus tornam-se ainda mais significativos quando entendemos exatamente quem é o Filho de Deus. Na época em que Jesus viveu na Terra (assim como hoje), havia muita especulação sobre Sua pessoa. Uns diziam ser Ele João Batista ou Elias. Outros, uma nova versão de Jeremias ou outro profeta, o que deixou até mesmo os discípulos confusos. Por isso Cristo fez a pergunta registrada em Mateus 16:16: “Vós, quem dizeis que Eu sou?” E Pedro, inspirado por Deus, respondeu: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo.”

Através dos séculos, Satanás vem lutando para remover essa verdade tão importante. Cria teorias heréticas na tentativa de desacreditar a divindade de Cristo e Sua obra. Uma dessas heresias abalou a igreja cristã primitiva. Tratava-se da doutrina gnóstica ou gnosticismo. Os gnósticos pregavam a existência de seres espirituais, semideuses, cuja missão seria mediar entre Deus e o mundo. “Culto aos anjos” é a expressão usada por Paulo ao referir-se ao culto a esses seres.

Para os gnósticos, Cristo era um desses semideuses e não o próprio Criador. Foi para combater essa doutrina que Paulo escreveu a carta aos Colossenses. No capítulo 1, versos 15 a 19, o apóstolo registrou: “[Jesus] é a imagem do Deus invisível, o primogênito [no sentido de primazia] de toda a Criação; pois nEle foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dEle e para Ele. Ele é antes de todas as coisas. NEle tudo subsiste.” Como tudo foi criado por Jesus, sendo Ele anterior a todas as coisas, Ele mesmo não pode ser criatura.

Ainda no capítulo 2, verso 9, da mesma carta paulina, lemos: “Porquanto, nEle [em Jesus] habita, corporalmente, toda a plenitude da Divindade.” Jesus é Deus (Rom. 9:5). É o Verbo feito homem (João 1:1-3, 14 e 18) para trazer esperança à raça caída. Portanto, a encarnação de Cristo é, na verdade, o maior milagre, a maior manifestação tangível do amor divino, enfim, o maior acontecimento já presenciado pelo Universo.

Colocar o oceano em um buraquinho na areia da praia pode ser uma impossibilidade. Mas como Deus é o Deus do impossível, o infinito se tornou “finito” na pessoa de Jesus. É a suprema e amorosa auto-humilhação divina, expressa em Filipenses 2:6-8: “Pois Ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes a Si mesmo Se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-Se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a Si mesmo Se humilhou, tornando-se obediente até à morte de cruz.”

A palavra “forma”, na primeira vez em que aparece no texto acima, vem do grego morphê, e expressa a natureza divina e humana de Cristo. Já a segunda palavra “forma” (forma de servo), no original se escreve schêma, ou seja, uma fase passageira. Embora a fase em que Jesus viveu como servo e “Homem de dores” (Isa. 53:3) tenha sido passageira, seus resultados são eternos.

Deus morreu!

Se o filósofo alemão Friedrich Nietzsche tivesse dito sua célebre e ultrapassada frase “Deus está morto” aos pés da cruz, naquela fatídica sexta-feira da paixão, até teria alguma razão. Algo realmente impressionante havia ocorrido ali: o Deus Filho estava morto!

Na verdade, toda a vida de Jesus aqui na Terra foi de mortificação. Ele viveu uma vida de privações e lutas. “Foi Ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado” (Heb. 4:15). Deus compreende nossos sentimentos e necessidades, pois Se identificou de modo muito especial conosco. Além da cruz, outro momento de sofrimento crítico ocorreu no Jardim do Getsêmani. A pressão foi tão grande que Cristo chegou ao ponto de suar sangue, fenômeno conhecido como hematidrose, conseqüência de dores e angústia quase inexplicáveis. O que Lhe fez seguir em frente foi a certeza de que Sua morte resgataria para Deus Seus filhos queridos.

Mas a vida e morte de Jesus não tiveram apenas um propósito redentor. Com o transcorrer do tempo, o homem passou a ter uma concepção errada do caráter de Deus. Entendia que Ele era puro, santo e justo, mas tinha dificuldades para ver nEle um Deus que ama, perdoa, coloca o coração na miséria humana e Se entristece com os erros de Seu povo. Por isso, “Cristo veio ao mundo para representar o Pai para o homem; pois Satanás O apresentara ao mundo sob uma falsa luz. Porquanto Deus é um Deus de justiça e de terrível majestade, que tem poder para destruir bem como para preservar o homem, Satanás induziu os homens a encararem-nO com medo, a considerarem-nO um tirano. Jesus estivera com o Pai desde os séculos eternos, antes da criação do homem, e veio revelar o Pai bondoso, que cuida dos súditos de Seu Reino. Ele declarou que nenhum pardal cai no chão sem que o Pai saiba disso, e que os filhos dos homens são de mais valor à Sua vista do que muitos pardais e que até os cabelos todos da cabeça estão contados”, escreveu Ellen G. White (Meditações Matinais, 22 de janeiro de 1992).

Assim, a história terrena de Cristo é uma evidência incontestável do amor de Deus e deixa claro até onde o Criador esteve disposto a ir pela redenção humana. “Pois Deus amou tanto o mundo, que entregou o Seu Filho único, para que todo o que nEle crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (João 3:16, Bíblia de Jerusalém). A palavra “entregou” poderia bem ser substituída por “matou”. Sim, porque não foi nada mais, nada menos do que isto: “...de tal maneira que matou o Seu Filho único”.

Na cruz o fogo da ira de Deus contra o pecado foi totalmente descarregado. Uma troca foi feita: o Deus Filho nos deu Sua vida eterna em troca de nossa morte eterna. Cristo Se fez pecado e sofreu as conseqüências disso. A justiça de Deus está satisfeita e Seus filhos possuem uma chance de salvação.

 

As sete últimas frases ditas por Jesus antes de morrer

1.                     “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem” (Luc. 23:34). O amor de Cristo na cruz abriu a oportunidade para o perdão de nossos pecados.

2.                     “Em verdade te digo, hoje estarás comigo no paraíso” (Luc. 23:43). Embora o próprio Jesus não tenha ido para o Céu senão três dias depois de ter dito isso (ver João 20:17), o que revela uma colocação equivocada da vírgula antes da palavra “hoje” (no original grego não há vírgulas), a conversão do ladrão foi um grande conforto para o Salvador. Foi a certeza de que Sua morte não era em vão.

3.                     “Mulher, eis aí o teu filho. Depois, disse ao discípulo [João]: Eis aí tua mãe” (João 19:26 e 27). Mesmo em meio à dor e agonia, Jesus ainda Se preocupa com Sua mãe e Seu discípulo.

4.                     “Deus Meu, Deus Meu, por que Me desamparaste?” (Mat. 27:46). O pecado faz separação entre Deus e o homem. Jesus Se fez pecado por nós e isso Lhe partiu o coração.

5.                     “Tenho sede” (João 19:28). O Criador dos rios, lagos e fontes Se fez um de nós. Sentiu o que sentimos e compreende nossas necessidades.

6.                     “Está consumado” (João 19:30). O plano de salvação estava concretizado. Nossa libertação do pecado estava garantida.

7.                     “Pai, nas Tuas mãos entrego o Meu espírito” (Mat. 23:46). Jesus, o Deus Filho, morreu. A natureza reagiu com escuridão, trovões e terremoto. O centurião que comandava os soldados romanos reconheceu: “Verdadeiramente este era o Filho de Deus” (Mat. 27:54).

 

Jornalista, redator da Casa Publicadora Brasileira e editor do site www.criacionismo.com.br